foto Simone Mattos - reunião final na EM Paula Buarque
O Projeto ESCOLA DA PAZ, trabalhando o conceito de CIDADANIA ESCOLAR, visa a resgatar a autoridade dos pais, o respeito à escola e o senso de protagonismo dos alunos, que passa por obediência e compromisso. Saiba como funciona no Caderno de Apresentação e Orientações, em link na coluna à direita. - - : denilsoncdearaujo@gmail.com
O PROJETO ESCOLA DA PAZ, POR MIM CRIADO, E NO QUAL ATUAVA EM REPRESENTAÇÃO DA VARA DA INFÂNCIA E DA JUVENTUDE DE PETRÓPOLIS, FOI ENCERRADO.SE VOCÊ O ESTÁ CONHECENDO NESTA VISITA, FIQUE À VONTADE E VISITE O BLOG. HÁ MUITA COISA QUE PODE SER ÚTIL A VOCÊ, À SUA FAMÍLIA E À SUA ESCOLA. FOI UMA AVENTURA MUITO LINDA. COMPROVE.ESTAMOS REPENSANDO UM OUTRO MODELO A SER IMPLANTANDO, COM PARCERIA DA OSCIP "REVIVAS".POR ORA, SE DESEJAR ACOMPANHAR AS MINHAS ATIVIDADES E PALESTRAS, VÁ AO MEU BLOG PESSOAL: http://denilsoncdearaujo.blogspot.com/Obrigado! DenIlson Cardoso de Araújo.

sexta-feira, 10 de maio de 2013

SER DO CONTRA

Denilson Cardoso de Araújo

Quando se adquire certa consciência de mundo, deve-se estar preparado para ser. Existir em plenitude. “Ser” traz solidão, muitas vezes. Aprender a ser só, avisou um poeta. Aprender a só ser, retrucou outro. Aprender a ser, digo eu, sem hamletianas dúvidas. Ser. O que implica ser adversário do “não ser”. Ser do contra. Contra o “não ser” que é a mediocrização da sociedade brasileira, a imbecilização dos adultos, a idiotização dos jovens. E para isso, imperativo é ser contra a entrega de nossas crianças e adolescentes ao hedonismo irresponsável. Ser contra pais que empurram filhos ao sexo precoce. Ser contra a mídia que estimula, o governo que ignora, a sociedade que se omite.

É preciso ser contra o fim do amor platônico, romântico aprendizado que precedia de forma deleitosa e necessária os “vamos aos finalmentes” nos relacionamentos adolescentes. É preciso ser contra crianças grávidas de crianças. É preciso ser contra o “quadradinho de oito”, este último degrau da decadência nossa, que produz searas de meninas cachorras. Vexame brasileiro que lei infeliz acelerou quando deu ao funk adjetivo de “patrimônio cultural”.

De que adiantam Leis Maria da Penha se a gente permite o adestramento sexual infantil? Não é difícil ver a conexão entre sexo precoce e maus tratos. Mulheres que pariram ainda meninas, frequentemente acabarão em relacionamentos ruinosos que destruirão vidas, suas e dos filhos. Desenlaces ruidosos, agressões físicas, filhos selvagens.

Sistema de dominação perfeito, bolou o status quo: sexo precoce. Não precisa droga na água, dispensa pílula de diária hipnose. Hormônios, o próprio corpo produz. Basta ativá-los antes da hora. Doses cavalares de pornografia, funk da ruína completa, novelas com periguetes e vagabas de plantão. Tudo sem controle. Afinal, “é intocável a liberdade de expressão”, e “pais é que devem orientar seus filhos”. Ora, temos pais zumbis, já antes adestrados na inércia moral e na frouxidão familiar. Padecem esse desvirtuamento da liberdade de expressão transformada em licença para matar. Matar infâncias, destruir inocências, fazer meninas-monstro, crianças maquiadas como profissionais das calçadas. O sexo precoce produz gente, mas extermina cidadãos, na mesma assustadora proporção dos nascimentos.

Atendi Lorraine, a quem concedo nome que foi moda. Queria ajuda. Beirava 30 anos, talvez, mas desprovida dos encantadores mistérios de Balzac. Tinha rude vida, inscrita na cara vincada de dores. Falava para dentro, baixos olhos baços. Bela já fora, se via. À mesa, põe seu problema. O dente. Faltava-lhe, na frente. De ajuntamento em ajuntamento desde a adolescência, terminara com 04 filhos, de pais diferentes. Moradia de favor em casa da derradeira sogra, entulhada num minúsculo quarto com a prole. Aturava gemidos da amante do companheiro no quarto ao lado. Humilhação para evitar o debaixo da ponte. E espancamentos. Ameaças de perder filhos. Um soco extraiu-lhe o dente cuja falta impedia o sorriso. Ela implorou. Que o covarde ao menos devolvesse seu dente, eis que, catando-o ao chão, aos deboches, o sujeito ameaçava atirá-lo na vala fétida. Que devolvesse, demandava ela, daria jeito de alcançar piedoso dentista que o colasse no lugar. Mas nessas horas, piedade inexiste. O dente virou esgoto.

Lorraine não era cidadã. Um não-ser que desconhecia direitos, Maria da Penha, ECA, Delegacia da Mulher. A patrulha policial debochou dela, que briga de casal não era bem vinda. Mas ele me tirou um dente, rogou, meu olho está roxo, mostrou, há hematomas no braço... Nada. Agora ali, se arrastando em sandálias de dedo, “descidadã” completa, depois da caminhada de horas, perdida, sob o vento da serra. O que pedia? Direitos? Justiça? Não. Queria só repor um infecto dente na boca.

A impressão de inutilidade me invadiu. Dente pequeno, perto da grande desgraça por trás do dente perdido. Para que dente em boca que, além de frequentar a fome, parecia que jamais resgataria um sorriso? Com ouvido atento e escolhidas palavras produzi os rasos confortos possíveis, providenciei os magros encaminhamentos plausíveis, muito inseguro, que a rede de serviços nossa é uma certa Somália. E ouvi mais.

Lorraine tivera filha que ficara com a avó. Desconhecia pai, a hoje adolescente, nascida de “bonde de baile funk”, esse voraz genitor de prole tanta. A mãe lamentava a própria juventude cachorra “rebolando até o chão”. Porque soube que, no círculo vicioso do exemplo ruim, era a filha muito assídua e necessária ao baile da comunidade. Brilhava no palco já com seu muito peculiar quadradinho de oito. Porque dispensava roupa de baixo, disse Lorraine, envergonhada e perdida... sabendo que cedo seria uma avó triste.

Lorraine, que hoje é contra o funk, bem assinaria este parágrafo, caso soubesse escrever. É preciso ser contra este cio dado a crianças como diversão libertária, e que ao fim das contas é cárcere. É preciso sair da caverna da inércia e, sob o sol, perceber o mundo que se racha sob nossos pés em abismos bocarras de mastigar brasis, engolir futuros, vomitar não-seres.
 
denilsoncdearaujo.blogspot.com

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